Em Bedford Falls, no Natal, George Bailey, que
sempre ajudou a todos, pensa em se suicidar saltando de uma ponte, em razão das
maquinações de Henry Potter, o homem mais rico da região. Mas tantas pessoas
oram por ele que Clarence, um anjo que espera há 220 anos para ganhar asas, é
mandado a Terra, para tentar fazer George mudar de ideia, demonstrando sua
importância através de flashbacks.
Comprando a Felicidade.
O título traduzido para o português como A
Felicidade não se Compra é um título bastante honesto. O original It's a
Wonderful Life (Como a Vida é Maravilhosa, Que Maravilha de Vida), também,
logicamente, reflete a situação que esse filme passa de maneira bem mais
gloriosa. Gosto também do trocadilho com o título do filme, ao dizer que a
Felicidade Não se Compa... ra. Nada se compara com a Felicidade, quando esta é
finalmente encontrada. Essa história conta aquilo que o cinema nunca deixou de
contar, e nem nunca fará questão de deixar de contar, que é: Como é a vida das pessoas?
Aliás, como a vida dessas milhares de pessoas que existem no mundo funciona? Será
que é diferente da minha? É incrível como esse questionamento é refeito
ininterruptamente. O interesse nas vidas alheias, alguns diriam, é o que faz
essa vida ser tão maravilhosa e incomprável! Nós não estamos apenas comprando o
bilhete do cinema, ou o livro a ser adaptado a história que será contando no
cinema, Nós estamos mesmo é comprando e comparando Vidas. Repara bem no que está sendo dito.
A felicidade não se compra, porém, Isso não a impede de ser posta a venda. De
lhe colocarem um preço específico. O que, de fato, ela está sendo; ela já é um
objeto a ser permutado, diga-se de passagem. E o seu preço está sendo a cada
dia mais barato que o dia anterior. A felicidade foi fragmentada em pedaços
desiguais. E isso é péssimo. Porque o gosto a ser sentido por uma felicidade
genuína não mais poderá lhe invadir por completo; isto por razão da felicidade
está sendo colocada a venda. Talvez futuramente percebamos a falta que ela traz.
Ou talvez a falta venha a ser revestida de um preenchimento que a complete por
inteira. Ou talvez fiquemos apenas no talvez existencial das
possibilidades vindouras incompletas.
Se fosse possível a compra da felicidade, caso esta estivesse à venda a qualquer cidadão, qual preço ela teria? Melhor dizendo e, reformulando a minha pergunta, acrescento mais palavras: Caso a felicidade estivesse à venda, Quanto você estaria disposto a pagar por ela?
Vendendo Sonhos.
A história de A Felicidade Não Se Compra trata de
vivências diversas que, em algum ponto da existência de um grupo de pessoas,
essas vivências terão um significado pontual que unirá um povo num único
propósito. Tudo começa na livre decisão de uma pessoa em fazer ao próximo um
favor. Favor esse que só fazem aqueles que se põem no lugar do outro.
Colocar-se no lugar do outro é uma árdua tarefa que exige de ti o teu todo. E
quando o seu todo trabalha em prol da unificação dos pedaços fragmentados,
estamos diante do significado da vida. Ver-se no outro aquele que você é
para o outro através de uma perspectiva paradoxal e simultânea do outro em si
mesmo. Todos somos um. Todos somos participantes de uma mesma Jornada. As
melhorias só são capazes através do conjunto de significados, partindo do individual ou coletivo e vice-versa. Ao fazer valer em
si mesmo, estará fazendo valer no coletivo.
Do Fim, e de volta, ao Início sem Fim.
O premiado cineasta mexicano Alejandro González
Iñárritu disse, no documentário Trespassing Bergman (Invadindo Bergman,
2013), que se o cinema fosse uma religião, a casa de Ingmar Bergman (Cineasta
Sueco) seria equivalente ao Vaticano. Porque, a partir de Bergman, o cinema
tomou um rumo amadurecido de tornar o cinema como um Testemunho de vida! Eu
diria que, se o cinema fosse uma religião, It's a Wonderful Life (A
Felicidade Não Se Compra, 1946) seria o Apocalipse desta “Bíblia
Cinematográfica”. Seria um ultimato; a última e definitiva mensagem de amor
pleno a ser propagada. Neste filme, o amor nunca havia sido tão homenageado! O
cineasta Norte-americano Woody Allen disse que, ao assistir ao filme Det
Sjunde Inseglet (O Sétimo Selo, 1957) de Ingmar Bergman, o cinema
deveria ter acabado ali; isso porque com aquele filme, segundo Woody Allen,
Ingmar Bergman contou tudo àquilo que o cinema precisaria contar; o saber já
estaria sendo testemunhado e, devido a esse atestamento do saber, nunca mais
seríamos os mesmos. E nós não somos mais os mesmos. Nem se quiséssemos, com
afinco e determinação, conseguiríamos ser os mesmos após o testemunho de que a
sua fé em Deus, como significado unívoco da vida, aliada a ideia
existencialista de morte e ressurreição, ser abalada. Renato Russo (musicista e
compositor brasileiro, peça-chave da banda de rock denominada Legião Urbana) disse,
certa vez, em seu livro O Trovador Solitário que através da música Será, eles, a Legião
Urbana, estariam contando ao mundo tudo àquele que eles queriam contar numa letra. Em
outras palavras, essa música possui uma força e inteireza capaz de se tornar
suficientemente completa. Detalhe: A música Será é a faixa número 01
do primeiro CD da banda, chamado de Primeiro! Eu gosto dessa ideia de fim
porque, pelo menos, ela nos dá uma relativa segurança de que existe um
“cadinho de terra” no fundo do oceano em que estamos pisando. Não se trata de um encerramento de temas
ou motivos. Mas sim de um desígnio que aponte onde a Fortaleza e seus
Fundamentos estão localizados. Nossa função é de ir até lá e voltar.
A Vida é
Maravilhosa!
Quando uma história, tal como
essa, se tornou capaz de atingir o Alvo, atingindo uma unanimidade de público,
e conseguindo unir variados povos pertencentes a posições ideológicas, políticas,
religiosas, filosóficas e psicológicas declaradamente contrárias entre si, então,
você se percebe, diante disso, como alguém que está sendo participante de algo
inconscientemente sobre-humano. Acima de nosso entendimento. Histórias assim
não apenas agradam, entretém e/ou divertem. Essas histórias unem todos num
propósito equiparável. Ela é um espelho para enxergarmos do lado de lá
melhor o lado de cá, e vice-versa. Enxergar esse outro lado da
existência é o mesmo que sentir que histórias assim são únicas, definindo-a
como um fabuloso testemunho de maravilhas ocultas e impensáveis. Ao fazermos
isso, dar-lhe-emos um valor que a distinguirá das demais, através de um
novo prestigiar, que o honre e, por fim, nos façam sermos compelidos a recomendá-lo
a todos os seres humanos, de todas as categorias e interesses peculiares. Tendo
a certeza do poder inspirador, pela fé mútua e inabalável, de que aqueles que a
assistirem serão tocados, se emocionarão e serão transformados em pessoas
melhores graças ao testemunho único e ampliador da perspectiva de um personagem
que representa a união dos povos. Um único personagem que fala com
todos de uma geração, e todos esses que o ouvem, falam dele aos outros milhares não como se
ele fosse apenas ele mas, agora, ao falar de um, estarão falando de todos,
porque todos são um. Todos foram atingidos por aquele que mirou mais alto do
que era capaz de mirar. E, através da atitude de um, todos foram beneficiados.
O Céu Já Decidiu Invadir a Terra.
“Seria Deus apenas uma
desculpa?” Bem, queria começar fazendo essa pergunta. Agora, sinto-me bem
melhor por tê-la feito. Então, agora que a fiz, irei explicá-la. Seria Deus uma
desculpa para contarmos outra coisa? Existem filmes classificados como “Filmes cristãos”,
assim como existem filmes classificados como “Filmes científicos”. Ambos são
filmes e obedecem as mesmas regras de qualquer outro filme, que seria a de
contar uma história a um público. Agora, se haverá uma aceitação deste público,
gerando assim o sucesso ou o fracasso, é outra história. A verdade é que não
conseguimos facilmente prever nada disso. A Felicidade Não se Compra não é um filme cristão
porque ela não possui os elementos religiosos mais adequados para se adequar a
essa determinada classificação. Porém, ela agrada a cristãos e ateus. Por motivos diferentes.
O Cristão dirá que o filme realça a ideia divina, introduzida por Jesus
Cristo, de que nós devemos amar ao próximo como a si mesmos e, portanto,
seremos transformados através desta relação que manifesta a graça de Deus. O Ateu
dirá que o filme enaltece a importância de se ter amigos, uma vez que a amizade
é um bem que nos modifica, transforma e faz com que consigamos enxergar a
realidade de uma maneira diferente. Felizes são aqueles que tem amigos. Discursos
bem diferentes. Porém, verdadeiros. Quem poderá julgá-los? Novamente pergunto. Se este filme não é classificado como um “Filme Cristão”, que privilegia os
elementos e ensinamentos do Reino dos céus, portanto, “Seria Deus apenas uma
desculpa” para contar essa história, ou “Estaria Deus no centro da história
desde o início?” Quando falo em desculpa para contar uma história, eu me refiro
a dizer que a história precisa ser obrigatoriamente contada por um ponto de vista de algum
personagem, para que isso já seja suficientemente bom para entendermos as suas
motivações, e que através desse personagem seremos direcionados a crença ou não em Deus. Porém, se o filme começa com Deus enviando um anjo para salvar a
vida de uma pessoa, e termina com essa pessoa transformada, contente e feliz,
junto de sua família, eu não poderia dizer que Deus foi o mediador, produtor,
executor e propagador da história desde sempre? Se através de uma simples,
porém honesta, oração de George Bailey a Deus, um homem não religioso, que pede a Deus que o tire desta situação, ao que Deus lhe manda um anjo logo após, percebo que nós não podemos
simplesmente aceitar que essa história é apenas uma metáfora que representa Deus indiretamente, seja como
vazio existencial ou como totalidade, e que todos os que se identificam com ela são completamente
diferentes um do outro. Todos são iguais. Todos carecem de Deus. Isso porque o
Céu decidiu por invadir a terra. Ninguém o clamou, pediu ou suplicou. Deus fez
o que fez e faz o que faz porque quer.
“E, se você
não Existisse, faria alguma diferença?”
A resposta a essa pergunta é aparentemente muito fácil. É só refazê-la, utilizando-se da contrapartida. Você, existindo atualmente, faz alguma diferença? Caso pudéssemos compreender
como seria a existência do aglomerado de entes que participam diariamente de
nossas vidas ou que, em algum ponto, foram tocados por nossa existência, caso nós
nunca tivéssemos pisado nesta terra como seres vivos, eu afirmaria que o universo
seria completamente outro. Não digo isso como se estivesse enaltecendo a minha
importância com uma particular vanglória. Digo isso porque sei (Será que sei
mesmo?) de minha importância ao outro. Essa é uma pergunta muito difícil de
responder, na realidade. Podemos supor um destino quase completo. Mas nós só somos capazes de irmos até certo ponto. O universo se reorganiza de uma
maneira tão rápida e contínua, que nós não temos a ideia do valor que as
pessoas possuem no que concerne as suas faltas e presenças. Posso postular que
se eu nunca tivesse existido, eu não faria falta na vida daqueles que
atualmente me amam. Mas eu entendo que aqueles que não sentiriam minha falta,
estariam em falta comigo, assim como, atualmente, todos estão em falta comigo e
eu estou em falta com todos. Vez ou outra vemos pessoas dizerem que sentem
falta de momentos em que nunca viveram. “Como é possível a falta de algo que nunca
viveu?” Perguntando assim parece até estupidez, mas perguntando assim “Como é
possível à falta de um preenchimento nunca experimentado?”, talvez, a pergunta
não seja tão sem sentido assim. É famosa a expressão “Ai que vontade de
experimentar um novo sabor que não sei qual é”. Como nós somos capazes
de sentir falta do vazio representado pelo inexistente? Bem, nós somos
complexos demais para entender isso sozinhos. Então, celebremos a existência do outro em nossas vidas. Graças a Deus.