CAPÍTULO
01
“Ninguém
sabe quem sou, Inclusive eu”.
“Com seu jeito de
ser, ela me enfeitiçou.
Me enlaçou e, sorrateiramente,
veio a mim,
E tomou de mim a
liberdade de ser quem sou.
Hoje eu a odeio,
como nunca odiei ninguém.
E vou além, pois
faço questão de dizê-la:
Sua desgraçada
traiçoeira,
Por que me roubou
de mim?
Você foi àquela que
retirou o meu privilégio.
Que inseriu em mim
o sortilégio de dizer que...”
– Espera um momento –
interviu Luca, abruptamente, o fluxo de consciência na leitura dinâmica de Gian.
A leitura que Gian estava fazendo era a de um trecho do Volume 2 de sua mais
nova obra poética chamada de “Notas Concernentes a Ela”.
Tratava-se de um
rascunho que fora redigido em seu notebook, sendo um acúmulo de poesias
aleatórias sobre descrições de seus sentimentos sobre às mulheres.
Luca, que estava lhe
ouvindo atentamente, portanto, solicitou, com um gesto, uma permissão para lhe
fazer uma pergunta. Gian logo parou de ler para lhe dar atenção. Luca se
inclinou para frente com seu corpo, contornando a sua cabeça, como se tivesse
que forçar a audição para conseguir compreender o que estava ouvindo.
– O quê foi? – perguntou Gian a
Luca, referindo-se a esse seu gesto de inclinação.
– O que é sortilégio? – perguntou
Luca, já dando visíveis sinais de esmorecimento, como se tivesse desistido de
lhe dar a atenção que momentaneamente havia ameaçado que tinha lhe oferecido.
E com um semblante de
enfado, Luca recuou o seu corpo e voltou à posição que estava. Dando uma leve risada
por ter cortado a leitura de Gian, pois Luca sabia o quanto que fazer isso o
irritava.
– O que é? –
perguntou Gian.
– A palavra...
sortilégio.
– O que tem ela?
– Sei lá, não
entendi a razão de tal palavra estar no texto.
– Não, é que a
palavra sortilégio foi a melhor rima
que encontrei, por enquanto.
– Ah, bom. Se você diz. Então, é dessa
maneira que cria os seus textos? Só se baseando em um conjunto de palavras que lhe
entreguem rimas?
– Não, não é isso. Estou só na primeira
versão.
– E como você sabe que a nota
está pronta?
– Ela só te dá sinais de que está
pronta ou não depois de lida. Textos vivem para serem lidos. E caso isso não
ocorra, seria em vão toda a nossa intenção de atribuí-lo algum valor que
acreditamos que ele tenha.
– Você fala como se isso fosse
ciência pura.
– Não chamaria de ciência pura. É
mais uma ciência complementar. Assim como toda forma de arte, ela tem a sua
particularidade, que necessita ser complementada por alguém, para continuar
viva.
– Isso me faz pensar se as
pessoas que leem os seus textos obedecem a essa sua regra que acabou de
inventar. Se elas continuam aquilo que você começou.
– Deveriam.
– Então, a sua primeira versão é
sempre tão desleixada assim?
– O que ocorre é que esse meu primeiro
rascunho serve para pôr a minha intenção primeira em destaque. Não me pouparei
ou resguardarei os meus sentimentos. Este primeiro momento é onde ponho pra
fora tudo que estou sentindo, independentemente da qualidade e do apreço que
possuo ao sentimento que estou tentando descrever. Não me sinto a vontade pra
avaliá-lo isoladamente e, por isso, deixo que ele fale por si. E dito isso, te
digo que esse sentimento vai sendo gradativamente explorado por mim, para que depois
de explorado devidamente, ele finalmente fique pronto pra ser apreciado. E isso
leva tempo. Pois é só com o tempo que o texto obterá um aspecto dinâmico, pois
só assim saberei que...
– Do que você está falando? –
questionou Luca as palavras de Gian com um tom de inquietude.
– É tudo questão de ritmo – respondeu Gian, ao respirar
fundo, de forma pausada, e ver que não estava conseguindo convencê-lo – em resumo,
é isso.
– Não entendo como conseguiu
chegar aonde chegou sendo tão prolixo assim. Tanto na fala como na escrita.
– O pecado não é não saber o que quer. Pecado é saber o
que quer e não o fazer.
– Pensei que pecado fosse tudo
aquilo que te distancie de Deus.
– Como saberei se estou me
distanciando?
– É só saber discernir o que te
faz se distanciar de si, a princípio. E assim saberá o que te aproxima do
pecado.
– E por pecado, você diz...?
– O medo.
Gian olhou para Luca
não como o seu amigo de longa data, mas como alguém que parecia saber
diferenciar o maior conflito da existência, que é o embate milenar entre o bem
e o mal.
– Desde quando virou teólogo?
– Há uns 2 minutos notei que
tinha o dom de observar quando os meus amigos não sabem que estão prestes a
cair de um penhasco, e aí resolvi ajudá-los.
– Você faz o erro parecer um
acerto de forma tão simplificada.
– Desculpe pelo transtorno. Vai
lá, volta a ler o seu texto pra mim. Sou todo a ouvidos.
– Ainda bem que resolveu se prestar
ao papel de ouvinte. Já que esse foi o único encargo que me lembro de ter
oferecido a ti, só por hoje.
– Achei esse seu texto muito rigoroso.
Foram palavras duras e inflexíveis.
– É claro que não ousarei escrever
as palavras “aquela desgraçada traiçoeira” em um texto que faça ode as mulheres.
Já pensou no alarde que isso teria?
– Ofuscaria a sua intenção –
complementou Luca.
– Sim... até porque a voz do
público não é uma voz tão separada da minha assim. Pelo contrário, a voz do
público é uma voz que quero compreender como que funciona. Por isso que a ouço.
Para tentar reproduzi-la em um papel em branco. E qualquer tradução errada disso,
geraria um efeito antagônico àquele que pretendo alcançar. Qual mulher assumiria
o papel de detestável e admitiria, simultaneamente, se identificar com tal descrição?
Mesmo que esteja me sentido assim, e mesmo que esta seja a revelação que quero encontrar,
não tomaria notas de tal forma só pra poder prosseguir em acusá-las de algo.
– Por que você escreve textos
assim mesmo, hein? Dentro da própria estrutura de seu texto, percebo que você
tem algo a dizer. E aqueles que têm algo a dizer, sempre deveriam ser ouvidos.
Mas, em contrapartida, por que essa sua escolha?
– Foi uma escolha. Como qualquer
outra que fiz na vida.
– Mas essa soa como diferente.
– Diferente em relação a qual
parâmetro?
– Diferente de quem você é.
– Não vejo motivos para isso
afetar tua lucidez. Por que essa
seria diferente?
– Me diga você.
– É questão de gosto. Se você
perguntar para um pianista o porquê da preferência deste pela música clássica,
ele não te dará uma aula puramente racional como resposta. Ele te dirá que
recebeu um convite para viver a sua vida de tal maneira e o aceitou. Poderia
ter ido pular Bungee Jumping ou servir a Marinha, mas não
foi. E não vejo eles serem questionados por isso. Você vê algum problema nessa
resposta? Pois eu não vejo.
– Não vejo um único problema.
Vejo problemas. Primeiro que quantas
pessoas você conhece que fazem Bungee
Jumping e servem a Marinha para usar
esse exemplo?
Gian
lhe dispõe um olhar confuso e abaixa a cabeça com a sensação de que talvez
aquela discussão não tivesse uma serventia. Ele põe o seu olhar em direção as
palmas de suas mãos, fechando e abrindo as mãos em um silêncio que deixa Luca
desconfortável.
– O problema é que – ele fala
vagarosamente a princípio, e depois converte a sua fala, que estava pacífica e
vagarosa, para uma mais ágil e controlada – você ver problemas em tudo. A vida
seria mais fácil se admitíssemos que às vezes as coisas são como são, sem
precisar traçar todo um arco lógico a procura de um sentido que faça com que o trajeto
inteiro precise obrigatoriamente ser explicado ou analisado para fazer sentido.
– Por que continua escrevendo
sobre isso?
– Uau.
– É uma pergunta completamente
diferente da anterior. Agora quero saber a sua motivação para continuar fazendo
o que faz.
– Deixa ver se entendi. A pergunta
que está me fazendo é “por que continuar investindo em algo que o retorno seja
garantido?” Essa é a pergunta que está me fazendo?
– Você faz com que minha pergunta
soe como descontextualizada. Ela tem um fundo de verdade.
– Eu sou pago pra escrever! É o
meu ganha-pão. Sou feliz pelo que faço. Não entendo como isso te deixaria com
pensamentos nebulosos.
– Você é um escritor que tem a
atenção específica de um público que te trata como vossa majestade. O público
feminino te abraça. E eu estou perguntando por que não cogitar a pretensão de expandir
esse território com a inserção de novos temas? Só isso que fiz.
– Novos temas?
– Sim. Investir em novas ideias e
criar novos projetos, pra variar.
– Acontece que cada texto que
escrevo é um novo projeto que estou dando vida. A minha vontade de criar é
inesgotável, assim como a fonte no qual retiro o desejo de escrever sobre o que
escrevo. Do que você está falando?
– A minha pergunta é: “Por que
falar sobre as mulheres?”
– Ah, mas é lógico. Entendi aonde
quer chegar com seu discurso exploratório. Você quer psicologizar a minha
escolha pra ver se consegue encontrar alguma relação com minha vida. Quer vasculhar
em minha alma alguma causa que possa justificar esse meu interesse, não é? Tipo
como quem sai à procura de algo em uma rua sem saída, com uma lanterna em mãos,
e que acredita que encontrará, mas que não sabe o que fará quando estiver com
este algo sobre a posse de suas mãos. E a minha resposta a sua pergunta é: “Eu
posso não te responder e ficar por isso mesmo?”
Gian deu meia volta pela
sala, pegou e colocou o seu notebook debaixo dos braços, oferecendo assim as
costas para Luca, e percorreu a direção contrária ao olhar que Luca estava
mirando.
– Fique a vontade – informa Luca,
com um tom seco na voz.
– Obrigado.
– Para onde você está indo? –
pergunta Luca a Gian, que estava caminhando por detrás dele, sem olhar para
trás.
– Eu vou fingir que tem alguma
coisa pra fazer aqui no quarto ao lado só pra não correr o risco de manter um
contato visual contigo, ok? Daqui a pouco eu volto.
– Sua vida suas regras, meu caro – sussurra Luca,
baixinho, para si mesmo.
Com o livro “Notas
Concernentes a Ela”, Gian havia alcançado um lugar de reflexão pessoal. Escrever
para ele era a parte mais fácil e prazerosa. Difícil era ser lido. Com esse seu
mais novo livro, ele pôde extrair de si mesmo a voz passiva que tanto queria lhe
aprisionar, tendo um diálogo com ela, e tornando-a ativa. E, através desse
diálogo, ele foi dando formas e formas para transformar a sua voz interna em
notas. Porém, o livro havia rendido a Gian também um insucesso pessoal. Pois, ele não sabia dizer como foi parar no lugar onde atualmente estava, ou sobre para
onde o processo criativo estava lhe induzindo.
Certa feita Gian
havia dito que “seus livros anteriores tiveram certo sucesso. Só não chegaram a
ter um alto alcance sincero. Ele acha que o motivo central para esse ocorrido
seria a diferença de anseios que cada um de nós temos. Enquanto ele dava cria a
um constructo poético, portanto, estava assumindo a responsabilidade de não
criar expectativas. Porém, alguma expectativa ele haveria de ter para continuar
insistindo na escrita criativa. Mas, de qualquer forma, a expectativa que tinha
sempre seria diferente em relação àquela que o público esperava dele. Autores
e público tem expectativas muito diferentes quanto à jornada, e talvez isso seja
pelo mesmo motivo. Eu não sei. O meu trabalho é escrever o que acredito e não
de desvendar esses mistérios”.
CAPÍTULO
02
“Onde
digo que Te Quero, Sem tu saber que fui eu?”
– Boa noite. O meu nome é Carlos
Junqueira e você está assistindo agora ao Programa ‘Boa noite e Fiquem a
vontade’, que está sendo transmitido ao vivo pelos estúdios do Canal AMMO, e
sendo exibido para mais de 80 países. Agora são 20:15.
Entre os destaques
dessa noite falaremos sobre as manifestações realizadas pelo conhecido Grupo Feminista
FREIHEIT que ocorreram hoje pela tarde, próximo a Prefeitura da cidade. A
líder do Grupo, que prefere usar o pseudônimo de “Harley Quinn”, encabeçou a
manifestação ocorrida nessa tarde alegando conflitos entre os argumentos dos Ministros
da Saúde do Presidente Temer, e as posições de um especialista da Saúde sobre a
legalização do aborto. O médico pernambucano, Olavo de Menezes, que se tornou o
primeiro brasileiro a concorrer ao prêmio Nobel de Medicina, que acontecerá em
outubro, disse que o Governo estaria agindo de má fé em achar que o Estado tem
supremacia nas decisões da família.
E ainda no assunto sobre
Saúde, um biólogo no Japão acaba de descobrir algo que mudará completamente a
forma que olhamos para os nossos gatos. Ele desenvolveu um aparelho que
transforma o miado do gato em fala humana. Isso mesmo. Você não entendeu
errado. Em fala humana. “Se os donos soubessem o que os gatos falam sobre eles
pelas costas, não seriam mais tão amigáveis assim com eles; eu fiquei assustado
com a quantidade de ameaças aos seus donos que eles fazem o tempo todo” – disse
o biólogo Yamaoka. Ele ainda complementou: “Os gatos possuem uma fala muito bem
articulada, e isso me deixou impressionado. Eles reclamam de tudo. Dizem que a
comida está ruim, falam mal da roupa que os seus donos estão vestindo e colocam
os pratos e xícaras prestes a cair em cima da mesa para apostarem qual dos
humanos burros irão derrubar primeiro”. E ele ouviu dos gatos ainda que “a única
razão para deixar com que os humanos toquem neles, é que ainda não descobriram uma
forma de fabricar “Ração Whiskas” com as próprias patas. Pois no dia que
descobrirem como que faz, irão desaparecer do mapa e apagar as suas pegadas da
areia logo em seguida”. O que nos faz considerar que o amor incondicional que
as mulheres tem para com eles devem os ter deixado muito mal acostumados nos
últimos 2000 anos”, brinca ainda o biólogo.
E nessa noite também iremos
falar sobre os mais novos formatos de literatura que estão surgindo. E teremos
3 convidadas especiais que fazem parte do Fã-clube da Editora “Quem
é Ela” para falar sobre o mais novo livro lançado por este selo e que se tornou
o mais comentado nos últimos meses. O “Notas Concernentes a Ela” foi escrito
por Gian Pietro e tem sido muito falado e debatido no mercado literário.
Iremos começar agora
com o bloco da entrevista. Estamos aqui com 3 convidadas para se juntar a gente
nessa conversa, que é a escritora Helena Studart, editora-chefe do Jornal
Problematizando e também youtuber, que
possui o Canal chamado: Falando sobre Tudo e Nada, ao mesmo tempo.
Eliza Nunes, que é escritora e blogueira do site Desconstruindo a Fsociety.
E também a professora de inglês Juliane Coimbra, que já esteve conosco em
outras oportunidades, e que também tem um Canal no Youtube chamado de: Vamos ao que Preocupa.
– Boa noite a todas. Obrigado por
terem aceitado o convite.
– Boa noite – dizem as 3 ao mesmo
tempo.
– Em outras ocasiões – continua
Carlos Junqueira, no início de sua fala – já organizamos um encontro que teve a
finalidade de debater o futuro da literatura. As novas plataformas tecnológicas
estão dando ao mundo opções. Aliás, bem mais opções do que necessitamos. Essa tem
sido a impressão que tenho. Mas, essa é outra discussão. E em meio a esses novos
formatos e maneiras de divulgação, acabamos por encontrar facilmente textos ou
crônicas que falam sobre o comportamento humano. Se existe algo que a
tecnologia não nos levou, pelo menos por enquanto, foi essa necessidade de
falarmos o que pensamos e sentimos. Mas ainda é muito precário admitir isso,
porque não sabemos muitas vezes com o que estamos lidando. E por não sabermos,
procuramos dar sentido a qualquer custo ao que fazemos. Mas às vezes não
conseguimos. E isso tem dificultado não apenas a interação uns com os outros,
mas também tem refletido diretamente em nossa opinião sobre o que outro tem a
dizer sobre nós... ou sobre si mesmo. Poucos são os que falam sobre si com
tamanha dedicação e empenho quanto aos que falam sobre os outros. Falar sobre
os outros se tornou a melhor forma de falar sobre si mesmo, mas de maneira
indireta. Ou em termos psicológicos ou psiquiátricos, falar sobre o outro
passou a ser a melhor forma que encontramos de projetar o pior e/ou o melhor de
si mesmo no outro e acreditar que com isso estamos isentos da responsabilidade
de falar de si. Mas não estamos. Vocês poderiam começar falando sobre a razão de
textos assim existirem? Se há alguma relação que esteja em conformidade com os
moldes como o mundo é. Em outras palavras, e aí será uma pergunta bem
existencialista, mas irei fazer. Digam-me, garotas. O que os textos dele dizem
a vocês, individualmente?
– Bem, eu acho que... – começou a
falar Juliane.
– Na verdade – se inseriu Helena no
embalo da resposta –, eles são meio que um apanhado de...
– Uma de cada vez garotas! –
sugeriu Carlos, num tom de brincadeira.
– Ah, me desculpe – assentiu Juliane
– Obrigada. Eu não sei. Acho que textos assim conseguem captar algo que sabemos
que está na nossa frente mas que não conseguimos enxergar. Por algum motivo. Acho
que é isso. Pra começar.
– É, tem um pouco disso – continuou
Eliza – Mas também parece que estamos passando por uma fase em que os textos
estão sendo obrigados a dizer as verdades sobre nós. E acabamos não aceitando
isso passivamente. Aquela linguagem mais romântica que as comédias de cinema
nos fizeram se acostumar, tem sido diminuída gradativamente, em minha opinião,
sabe? E isso é o resultado direto de vivermos dentro de uma bolha, que é uma sociedade
que compartilha de opiniões e ideais cada vez mais e, com mais frequência, de
coisas que não leu. Quando surge alguém para falar sobre mim, da maneira como o
Gian escolheu para falar, aí eu estranhamente fico surpreendida. Não é verdade?
É como se o outro estivesse pensando por mim. Ele não está me pedindo permissão
para falar sobre mim. Ele está falando sobre mim e me mostrando que entende
sobre mim melhor do que eu mesma. Como se ele estivesse vivendo minha vida em meu
lugar.
– E isso não é assustador? –
perguntou Carlos.
– Não! Isso é mágico. Pois me faz
enxergar qualidades que nem eu mesma sabia que tinha. E palavras assim dão um
cruzado direto no coração. E desse jeito fica inevitável não se identificar.
– Então, em outras palavras – disse
Carlos –, estão dizendo que ele está apenas comunicando a vocês algo sobre
vocês que já sabem sobre si mesmas. É isso? Aquilo que vocês já sabem, mas que mesmo
assim são surpreendidas. É isso que estão dizendo?
– Olha – continuou Eliza –, penso
que a gente só diz que sabe depois de ouvir alguém dizer. Antes de ouvir, quem
vai dizer que já sabia? É mais fácil dizer que já sabia depois de ouvir ou de
ter lido.
– De onde surgiu essa necessidade,
e aí eu vou tomar a posição de que a sociedade inteira está amarrotada nisso,
ok? Digo, essa necessidade de ser descrita pelos olhos alheios, e se sentir
privilegiada por uma descrição de um desconhecido? – perguntou Carlos.
– Desde que o mundo é mundo isso
ocorre – respondeu Juliane –, e com uma regularidade impressionante.
– Não acham que ele está apenas
dizendo aquilo que gostariam de ouvir sobre si mesmas? – perguntou Carlos.
– Como assim, apenas? – perguntou Eliza.
– Acha isso supérfluo? –
perguntou Helena.
– Não... não, necessariamente, essa
palavra – disse Carlos – Eu não a usaria agora. Diria que é... mais do mesmo.
– Mais do mesmo? – perguntou
Helena.
– Sim. No sentido de alcance a
fórmula do sucesso – respondeu Carlos.
– Eu entendo a sua preocupação –
disse Juliane.
– Vocês foram capturadas por ele,
de fato, garotas. Ele tem carisma. Isso é oportuno – disse Carlos.
– Não é porque ele disse o que eu
queria ouvir que esteja me enganando – disse Juliane.
– Sim, é verdade. Eu concordo.
Mas me refiro às mulheres lá fora. O que elas tem a dizer sobre isso, entende? –
perguntou Carlos.
– Entendemos o seu ponto. E é
oportuna a oportunidade de reflexão que essa discussão nos abre. Mas você está
criando uma situação de risco agora – complementou Eliza.
– Não, não, olha – continuou
Carlos, gesticulando e olhando para a câmera – Quero deixar isso bem claro a
vocês que estão nos assistindo. Se você ligou a televisão agora, nós estamos
recebendo aqui no programa a escritora Helena Studart, que é editora-chefe do
Jornal Problematizando e também youtuber,
com o seu Canal: Falando sobre Tudo e Nada, ao mesmo tempo. Também
recebemos a Eliza Nunes, que é escritora e blogueira do site Desconstruindo
a Fsociety. E por último, recebemos a presença também da professora de
inglês Juliane Coimbra, que tem um Canal no Youtube
chamado de: Vamos ao que Preocupa. E nessa noite estamos falando sobre o
livro “Notas Concernentes a Ela”, do escritor brasileiro Gian Pietro. Lembramos
que o escritor Gian Pietro não pôde estar aqui por motivo de agenda, mas
achamos oportuno a conversa com essas 3 mulheres já que elas são representantes
diretas dele, e também porque o assunto tem crescido bastante.
E volto a dizer, como
estávamos falando agora pouco, que ele conseguiu o que queria com a sua escrita.
De acordo com a maneira como escolheu escrever. Assim como muitos outros também
o fizeram. Só penso que deveríamos abrir espaço para novos conteúdos artísticos
e formatos em que mais pessoas falem sobre as mulheres, sobre os homens, sobre
todos nós. Vivemos numa época de escassez de representatividade. E isso não é
segredo a ninguém. E quando surge alguém falando frases de efeitos, ou qualquer
coisa que o valha sobre qualquer um, não é de se estranhar que esse alguém seja
automaticamente posto no pódio de honra ao mérito. Não deveria.
– Isso não seria outra maneira de
dizer que as mulheres são facilmente iludidas na sociedade atual? – perguntou
Helena.
– Ou seja, mais uma vez
procurando um culpado – complementou Eliza.
– Eu não disse isso. Eu disse que
deveríamos ser mais exigentes quanto ao conteúdo que consumimos – respondeu
Carlos.
– Ser mais exigente? Você como sendo
um representante da mídia, diria que a imprensa tem propagado a diminuição
desse nível de exigência que está se referindo? Porque não me parece que estamos
falando sobre o mesmo tópico que começamos no início – disse Juliane.
– Também entendi assim. Que nível
de exigência é esse que está falando? – perguntou Eliza.
– O nível de exigência que me
refiro é o de você saber como mediar o conteúdo que consome – respondeu Carlos.
– Eu acho que a discussão aqui
está sendo a de procurar à causa para o sucesso que o livro “Notas Concernentes
a Ela” alcançou, não é? – disse Juliane – Eu posso falar pelo que tenho
escutado. Acho que as situações que tenho vivido em relação à repercussão desse
livro tem me mostrado algumas coisas. Primeiro que a gente não se conhece como
deveria. Falamos que nos conhecemos até vim alguém e dizer como nos parecemos aos seus olhos. E isso às vezes maltrata porque estamos mal acostumadas a ouvir elogios
que muitas vezes não condizem com a realidade. E isso nos demonstra algo muito
complicado de se admitir. Que é o valor de um elogio, entende? Quanto realmente
vale ser elogiado ou elogiada por alguém. Livros como esse, o “Notas
Concernentes a Ela”, é um livro que levanta elogios às mulheres. Porém, não
podemos só culpar aquele que elogiou alguém injustamente. Existem várias formas
de elogios. Um elogio pode ser transmitido quando alguém
fez algo louvável para o merecer. Mas muitas vezes o elogio surge
quando menos se espera. Se recebêssemos elogios apenas quando merecemos,
receberíamos quantos? 1 a cada 3 meses? Talvez bem menos. Não sei como todas
as mulheres pensam. E nem mesmo o Gian sabe disso. Ele apenas está tentando
passar adiante algo que ele considera honesto e lapidado o suficiente para ser
lido. E é bem por aí que passamos a entender as coisas.
– Vocês diriam então que seria o
Gian o último romântico do século 21? – perguntou Carlos.
– Na verdade, eu acho que o último
romântico é o meu noivo – respondeu Juliane.
Todos
riram com esse comentário.
– Quando será o casamento? –
perguntou Carlos.
– Em Novembro – respondeu
Juliane.
– Muito bem. Obrigado a todas vocês
pela presença mais uma vez – agradeceu Carlos.
– Nós que agradecemos – as 3
dizem ao mesmo tempo.
– O livro está em todas as
livrarias? – perguntou Carlos.
– Sim, é só ir a uma livraria que
ele estará lá – respondeu Eliza.
– E em agosto teremos o volume 2 que
ainda está sendo trabalhado – complementou Helena.
– O volume 2 virá no mesmo
formato de poesias? – perguntou Carlos.
– Tudo indica que sim – respondeu
Juliane – Mas não sabemos ainda. Teremos que aguardar também.
– Ótimo. Eu conversei aqui com as
escritoras Helena Studart e Eliza Nunes, e a professora Juliane Coimbra sobre o
livro “Notas Concernentes a Ela”. Se você se interessou por esse Livro é só
pedi-lo através do site que está aparecendo aqui, logo abaixo de seu televisor,
ou você pode também ligar para o número que aparece aqui no canto superior
direito de sua Televisão. No próximo bloco iremos falar sobre o futuro da
Marvel e da DC nos cinemas. Não saia daí pois já voltamos.
CAPÍTULO
03
“Tanto
pra ouvir, Tão pouco pra dizer”.
“Ouço-a sussurrando. Parece código. Talvez seja a linguagem secreta do amor. O silêncio que complementa a minha fala torna-se um enigma. Não sei como decifrá-lo. Ao mesmo tempo em que as palavras não ditas são de difícil compreensão, também são palavras que revelam o interior de quem o diz. Quem a diz, a diz como forma de promessa. Mesmo que tente e queira entendê-la, não chegaria próximo do sentido. Sei que conforme introduzo e avalio as palavras ditas por ela, não consigo encontrar um sentido. Esqueço-me da procura por sentido e simplesmente continuo a ouvindo. Ouvi-la é o segredo que estabeleço. Logo em seguida contorno minha atenção para ela. Contorno a minha atenção para sua silhueta. Ela está bailando diante de mim. Não sei o que dizê-la. Não sei como trazê-la para próxima de mim. Só sei que ela existe, e eu também”.
– GIAN PIETRO (NOTAS CONCERNENTES A ELA, VOL. 2).
Gian estava ao
telefone. Seu semblante era de cansaço como se a ligação durasse horas. Parecia
estar na mesma posição há dias. Ele simplesmente ouvia o que a pessoa do outro
lado da linha falava. A voz do outro lado era grave e rápida. E ela lhe dizia: “Acho
que está mais do que clara a intenção que esse jornalistazinho Junqueira queria,
não? Ele quis tornar as notas quase como um erro. Quis dizer que ela é um
reflexo de seu criador. Você sabe o quanto que ele tem falado mal de ti nas
últimas semanas, não sabe? Dizendo que é um absurdo que escritores como você
existam. Só faltou dizer que você está propagando uma arte inferior, e que é um
câncer para a sociedade. Não importa o que ele pensa. O que importa é o que o seu
público pensa. São eles que pagam as suas contas, certo? Mas, de qualquer forma, já falei com seu advogado. Ele vai tomar as providências. Isso é difamação! E
em cadeia nacional! Absurdo! Fique tranquilo, pois iremos resolver isso, ok?
Amanhã conversamos mais. Tchau!”
A pessoa do outro
lado da linha desligou abruptamente. E ao desligar o telefone, Gian se
espreguiçou e passou as mãos pelos seus cabelos, demonstrando um cansaço físico.
Ele olhou para frente e viu que o seu amigo Luca estava ali estacionado,
olhando para ele, e com seu ombro encostado próximo a porta.
– Quem era no telefone? – perguntou
Luca.
Gian esboça um olhar
de enfado. Fecha os olhos por alguns segundos. Oferece a ele um bocejo demorado.
Depois disso, lhe responde com uma voz desinteressada. Como se fosse uma
informação que tivesse repetido a exaustão o dia inteiro.
– Meu pai.
Luca descola suas
costas da porta e vem em direção a Gian para sentar num banco preto próximo.
– O que ele queria? – perguntou
Luca, ao se sentar no banco.
Gian hesita
responder, mas logo cede.
– Você sabe... ele está
irritadíssimo com a entrevista desse jornalista Carlos Junqueira de ontem à
noite sobre o Livro – Gian abre as mãos com desdém pela pergunta de Luca, como
se fosse óbvia a resposta.
– Ele também é o seu empresário –
disse Luca.
– Ele tem suas razões, é claro.
– Sobre ontem, diria que não
achei a entrevista tão ruim assim.
– Não achou?
– Não. O que você achou?
– Achei apelativa.
– Talvez um pouco, mas nada
comprometedor. Eles apenas falaram sobre a repercussão. Não dá para ignorar o
que o povo diz. Não é?
– O assunto era um só. E foi isso
que me deixou pensativo. Eles falaram sobre várias coisas, mas a conversa
sempre voltava para o tema-central. “Será que é necessário vir alguém de fora para
dizer algo que já sabemos sobre nós mesmos para nos alegrarmos?”
– Esse era o assunto.
– Sim. E está longe de ser a
realidade daquilo que escrevo. Mas entendo quem pensa assim sobre mim. Até eu
já pensei isso de mim.
– Qual impacto isso terá na sua
carreira? Pois pra mim parece, não sei para você, que não estamos mais falando apenas
sobre compras e vendas. Agora estamos falando sobre egos. Agora fazer sucesso é
sinônimo de mau gosto, por acaso?
– Nunca pensei que viveria para
ver um dia você do meu lado.
– Acha que estou do seu lado?
– Deixa para lá. Prefiro nem
responder. Irei dizer aquilo que geralmente não gosto de dizer, mas a situação
pede que o diga. Ele fez aquilo que achou ser o correto. E o errado são aqueles
que pensam o contrário dele.
– Sim. Ele expressou sua opinião.
Isso é o direito de cada um. Os números de vendas do seu livro comprovam o
contrário a opinião dele.
– Não é questão de compras e
vendas. E muito menos de ego. A questão é que acho que ele... –
Gian hesita em dizer o que iria
dizer – de certa forma o que ele disse. Ele...
Ele o que? – questiona Luca.
Gian
passeia os dedos de suas mãos num deslize que vai da testa até a nuca. Ele põe
as mãos encostado a nuca como se estivesse totalmente rendido aquele momento.
– Ele tem razão.
Essas foram às
palavras que Gian encontrou. Ele disse isso como se tivesse sido convencido por
si mesmo naquele momento. Suas palavras agora tinham uma direção certa. E isso
pareceu aos olhos dele algo estranho. Pois as suas palavras “ele tem razão” agora
tinham um peso jamais percebido por ele. Era como se cada letra soasse como
indiferente pra ele até aquele momento. Justamente naquele momento essas
palavras encontraram um significado e se manifestaram. As palavras “ele tem
razão” se converteram em “preciso rever os meus conceitos” daqui em diante.
Luca percebeu que as
palavras de Gian esboçavam um peso. Procurou palavras para lhe confortar e lhe
disse.
– Bem, você diz que ele tem razão
mas eu... fiz meu dever de casa. Parecia mais que ele quis escolher aquele
momento para descarregar toda a inveja por não ter conseguido ser um escritor
que queria.
– Como assim?
– Eu fui stalkear ele, é claro. E
adivinha só o que achei? Nos anos de 96/97 ele publicou 3 livros. Um de terror,
um de literatura fantástica e um último que era infantil. Nenhum deles venderam
mais do que 2 mil edições. É natural que um livro como o teu o faça se sentir
injustiçado.
– Não vejo motivos para ele estar
infeliz. É o apresentador de televisão mais bem pago do país.
– Dinheiro não é tudo.
– Às vezes o dinheiro só serve
para ocultar uma infelicidade. Ela ainda está lá. Só que é latente.
– Eu não sei o que pensar. Às
vezes me dou responsabilidades que sei que não cumprirei. Não sei se deveria
continuar aquilo que nem devia ter começado.
– Você não pode parar de
escrever.
– Se eu parar de escrever virá
outro em meu lugar. Esse é o ciclo da vida.
– Você sabe que ciclos também se
fecham.
– As pessoas precisam de ti.
– Ninguém deveria precisar tanto
assim de alguém. Isso não é saudável.
– Eu não sei como será daqui em
diante.
– O que você irá fazer?
– Irei viajar por alguns dias. Estou
me cansando de olhar para as mesmas pessoas.
– Para onde vai?
– Ainda não sei.
– Vá para esse Hotel aqui. É uma
estadia de uma semana que um amigo me deu.
– Que amigos são esses que você
tem?
Luca lhe dá um
Ticket.
– É o melhor a se fazer mesmo. Liberte-se
da rotina dessa sua vida de faz de conta.
– Minha vida de faz de conta? –
perguntou surpreso Gian, por não saber ao que Luca se referia.
– As notas.
– É assim que você as enxerga?
Como um faz de conta?
– Como você as enxerga, então?
– Eu não quero discutir com você
agora.
– Sabe que nunca gostei dessa sua
disposição de nunca responder ao que pergunto?
– Você sabe como eu as enxergo.
Elas são poesias. O que mais seriam? São retratos da alma. O que há de tão
diferente em meus textos que você sempre prefira atacá-los? Eles são
oportunidades. São um convites. São possibilidades que escrevo, onde as pessoas
me pagam pra contá-las.
– Pra quem são essas Notas?
– Você não desiste, hein?
– Uma hora você dirá.
– Não é assim que funciona.
– O que você quer provar com isso?
– Não é isso!
– Sabe de uma coisa? Um dia você
precisará dar conta de todas as palavras que saem de suas mãos. Estará seguro
quanto a isso?
– Você faz com que soasse que sou
a maior farsa que já existiu. É tudo ficção, tudo verdade. São tudo formas
diferentes de se dizer a mesma coisa.
– Pra quem são as Notas?
Essa
pergunta fez com que Gian se alterasse e evocasse com força uma resposta ao
esbravejar:
– Já lhe ocorreu que eu não
responda por que não sei, e não porque não quero?
Luca
recuou ao ver os olhos de Gian brilhando de fervor com a resposta que acabara
de dar. Gian manteve o seu olhar a penetrar no de Luca.
– Finalmente um momento de sinceridade
– apontou Luca, com uma reação sincera de admiração por tal resposta – Ainda te falta lucidez, mas parabéns.
– Era isso que você queria de
mim? – perguntou Gian com um tom sarcástico na fala.
– Ainda não sei. Talvez quando o peso
incômodo do orgulho te alcançar, a lucidez venha a aparecer.
– Como meu amigo, você deveria
estar fazendo um papel completamente contrário do que está desempenhando agora.
Luca
olhou para o chão depois desse comentário de Gian. Depois de alguns segundo
pensando no que falaria, se levantou e se direcionou a porta. E antes de sair
lhe disse.
– Aquele jornalista tem razão em acusar o teu Livro do que bem entender. Mas você tem que tomar uma decisão: É ao Livro que ele está acusando ou é a você?
– Aquele jornalista tem razão em acusar o teu Livro do que bem entender. Mas você tem que tomar uma decisão: É ao Livro que ele está acusando ou é a você?
Gian
observa o seu amigo Luca sair da sala. Após sua saída, Gian permanece em
silêncio na sala em sua casa. Depois de alguns minutos ele abre a 1ª versão de
seu Livro, “Notas Concernentes a Ela Vol. 2”, na minha página que a sorte de
uma abertura aleatória de um Livro dispõe. Ele abre em uma página onde estão
escritas as seguintes palavras:
“O amor é como um dia nublado. É
impossível prever seus movimentos.
E muito menos saber de onde veio
e para onde vai.
O amor não te dá motivos.
Mas, mesmo assim, todos querem.
O amor não dá desculpas.
Mas, mesmo assim, nós insistimos em
dar.
Um amor em notas, como será?
Notas para poder registrá-lo.
Um retrato do sentimento. Um amor
em Notas, Em versos simples,
Cujo é inserida, uma nota nova a
cada instante.
E sobre essa Nota, Escrita em Notas,
e sobre Notas,
E através de Notas, vemos o
surgir de ‘Notas que Foram escritas
Para serem notadas’.
Que foram Expressas,
Para serem sentidas.
Simples Notas,
E isso Vem a ser,
Por si só,
Admiravelmente,
Precioso”.
GIAN PIETRO (NOTAS CONCERNENTES A ELA, VOL. 2).
CAPÍTULO 04
“Antes
de escrever, Seja apenas você”.
Gian chegou ao Hotel.
Queria estar em um lugar onde estivesse livre das responsabilidades da vida. Se
fosse necessário, ofereceria toda sua fortuna em troca de paz e uma noite de
sono. Queria se livrar da liberdade de ser ele por alguns dias. Queria
simplesmente esquecer que tinha a vida que tinha, e se ausentar deste mundo para
poder ser quem ele quisesse ser. E foi isso que ele fez. Pegou suas malas e
sentiu-se convocado a ir ao encontro da primeira oportunidade que lhe apareceu.
Ao chegar ao Hotel,
passou pela recepção para fazer o cadastro e depois passou pelo corredor do
lobby do Hotel que dava no elevador. Ao ver que a porta do elevador estava se
fechando, gritou:
– Pode segurar o elevador pra
mim, por favor?
– Sim, claro – uma voz feminina gritou em resposta .
– Pronto – continuou a voz
feminina.
– Obrigado – disse Gian.
– Sem problemas – respondeu a
voz.
Ao
entrar no elevador, Gian viu a mulher dona dessa voz. Ela estava vestida de jeans
e blusa branca. Ele olhou tanto para ela que acabou passando do ponto. Fazendo
com que ela percebesse esse seu indiscreto olhar.
– Você está com cara de quem quer
saber qual o meu nome, suponho – disse a mulher.
– Não... não, eu não... – respondeu
Gian, com um pesar na voz de vergonha – ... na verdade, não sabia que tinha uma
cara pra isso – emendou uma resposta confusa.
– Pois saiba que existe sim.
– Desculpe. É que nunca sei
como me portar dentro de um elevador, sabe? É bem difícil dar limites a si
mesmo.
– Te entendo, se serve de
consolo.
– Sempre serve. Mas agora pôs uma
dúvida em mim. Quando chegar a minha casa irei imediatamente me olhar no espelho
pra saber como é a cara de quem está
querendo saber o nome de alguém. Essa é nova pra mim.
– Você podia perguntar qual é o meu
nome, por exemplo.
– Se me conhecesse, saberia
que consigo adivinhar nomes só de olhar pra pessoa.
– Sério?
– Só de olhar para o rosto sei
qual é o nome. Estou te dizendo.
– Não sei o que dizer quanto a
isso.
– E nem precisa.
– Tudo bem, então.
– Que bom! Irei me concentrar. Olhando
para você, sinto que o teu nome é curto.
– Por que olhar para mim te faria
perceber isso?
– Estou quase terminando.
– Pois, agilize. Já que estou quase
chegando no meu andar.
– A sua beleza é chamativa. Aliás,
tudo o que é belo chama a atenção, todavia a sua beleza chama a atenção não
porque ela necessite. Mas sim por funcionar como um encaixe perfeito em meus
olhos. E o seu nome é curto pois há simplicidade em seu olhar. E esta
simplicidade se reflete em...
– Desculpa te interromper. Mas é
que chegamos em meu andar. O 11º andar. E é aqui onde estou.
– Ah, não! – Gian lamentou.
– Tudo bem. Podemos conversar em
outro momento. Sem problemas, por mim.
– Ótimo.
– Boa noite.
– Boa noite.
Quando
a mulher disse boa noite, logo se virou. E enquanto ela se retirava, ao som das
portas do elevador se fechando, ouviu Gian lhe dizer com uma voz segura e firme:
– Ah, e o seu nome é Lara, a
propósito.
A
moça imediatamente parou e se virou com um semblante de surpresa. E ao se virar
só deu tempo de olhar as portas se fechando e soltar a pergunta no ar:
– Como é que você...? – a porta se
fechou, ao contrário da boca surpresa de Lara.
Na manhã seguinte, a
maioria dos hóspedes estavam no saguão do Hotel. Alguns dentro da piscina e
outros tomando o seu café da manhã. Em meio a essa multidão nós vemos a Lara,
jovem de 28 anos, saindo da piscina e indo em direção a sua toalha que estava
sobre uma cadeira para se enxugar. E quando se aproxima para enxugar o seu
rosto, avista a Gian, sentado numa cadeira ao lado.
– Quanto tempo está parado aí? –
pergunta Lara, assustada.
– Bom dia, Lara – diz Gian com um
entusiasmo na voz.
– Você ainda terá que me dar
satisfações sobre como descobriu o meu nome.
– Não posso revelar o meu
segredo.
– Então, saiba que irei imaginar
o pior cenário possível para isso.
– E qual seria?
– Que você é um pervertido que me
perseguiu, ou que me perseguia, e agora... tipo, tem stalkeado a mim há meses.
Ou talvez bem antes! Nunca se sabe.
– Qual é! Acha que sou um voyeur ou alguma variação bizarra entre
o Christian Grey e aqueles autistas que acertam tudo no blackjack em Las Vegas?
– Nossa, agora você foi bem longe.
– Não tão longe quanto você está
indo.
– Ok. Vamos começar de novo?
– Por mim tudo bem.
– Olá, prazer. O meu nome é Lara,
e estou aqui neste Hotel porque abandonei o meu noivo no altar. E qual é o seu
nome?
– Oi. Meu nome é Gian. Tudo bem
com você, Lara?
– Sim, Gian. Apesar de ter
abandonado meu noivo, está tudo bem comigo. Obrigado por perguntar. E com você
está tudo bem também, não é? Espero que sim.
– Tudo ótimo. Obrigado por ter
perguntado também.
Os
dois ficam em silêncio, e olham um para o outro. Depois de alguns segundos de
silêncio, caem na gargalhada.
– E como chegou aqui? Qual a
sua desculpa para estar aqui? – perguntou Lara.
– Você abandonou mesmo o seu
noivo no altar?
– Claro que não – Lara hesita e,
depois, responde – eu o matei.
– Entendo. Dizem que essa é a
melhor forma de resolver os problemas – deu uma pausa na fala – matando-os.
Ambos
ficaram em silêncio. Agora era um silêncio sério. Como se fosse uma cena de
faroeste onde ninguém sabe o momento e nem sobre o que falar. Lara percebeu uma
inquietude no comportamento de Gian. E Gian, por sua vez, cogitou que a Lara
estivesse falando sério quanto ao assunto com o seu noivo. Lara o olhou e
ameaçou dizer algo que estava preso nos dentes. E então lhe perguntou:
– O que quer me dizer com o seu
silêncio?
Gian
a olhou e pensou no que responderia e simplesmente soltou palavras como se
estivesse delatando pessoas de crimes que cometeram para a polícia.
– Você estava de crachá e não
percebeu.
– Oi? – perguntou Lara, confusa.
– Foi assim que eu soube o seu
nome – continuou Gian – Estava escrito
no crachá que usava.
– Não estava de crachá.
– Então, como descobri?
– Ah... mas é claro! Estava na casa
de minha irmã. Minha sobrinha fez um crachá pra mim, é óbvio. Esqueci que ainda
estava usando. Massa. Parabéns, Sherlock.
Lara
ficou em silêncio e então perguntou:
– Sério, o que está fazendo por
aqui mesmo?
– Vim aqui para tentar pôr a
cabeça no lugar.
– E onde sua cabeça estava antes
de vim para cá?
– Ela estava sempre onde não
queria que estivesse.
– O que faz da vida?
– Sou escritor.
– Algum livro que conheça?
– Nunca ouviu falar do “Notas
Concernentes a Ela?”
– Não que lembre. De quê fala
esse livro?
– É um livro de poesias, basicamente.
E fala sobre as mulheres. Aliás, são notas, descrições ou comentários referentes
às mulheres. Sobre o universo feminino e suas particularidades.
– Você é gay?
– Como é? – perguntou Gian,
assustado.
– Esse seu interesse é bem...
– O quê? – interrompeu Gian – Gay?
Escrever sobre as mulheres faz de mim gay, agora?
– Não... sei, quer dizer, o que
você acha?
– Não. É claro que não!
– Tudo bem, então você não é gay.
Não sei por que ficou esquentadinho. Você é um homem, hétero e branco que fala
bem das mulheres. É raro demais isso, mas é o que você é. Irei te dar 3
estrelinhas de créditos.
– Não disse que falo bem das
mulheres.
– Fala sobre o quê, então?
– Falo sobre o que sinto e sobre
o que vejo, em relação às mulheres.
– Por quê?
– Por que, o quê?
– “Por que falar sobre as
mulheres”. Essa é a minha pergunta.
– Ora, por que não falar sobre?
– Ficarei calada a espera de uma
resposta útil sua.
– Tudo bem... é tudo questão de
escolha.
– Num tinha um assunto melhor pra
falar do que esse, não?
– Foi uma escolha que fiz. Vi que
escrever sobre as mulheres me dava um prazer e a partir disso, continuei
escrevendo sobre.
– Te dava prazer? Nossa, como é
que Freud chamava isso mesmo, hein?
– Ora, ora, você me entendeu.
– Bem, até onde eu sei, o que nos
importam não são só as nossas escolhas, mas também as verdades reveladas por
detrás delas.
– Eu sou a verdade por detrás de
minhas escolhas.
– Você é? Nossa, não sabia que o mundo
girava em torno de você.
– Não foi isso que quis dizer.
– Mas foi isso que deu a
entender.
– Você entendeu errada a minha
intenção. Não sacrifique o que eu disse.
– Talvez eu seja até estúpida.
Pode ser que não tenha entendido realmente o porquê de você fazer o que faz
e blá blá blá. Isso eu aceito. Mas, não
venha me dizer que não te entendi, pois você não deixa clara a sua intenção em
nenhum momento. E isso me deixa muito confusa. E se você me deixou confusa,
quiçá, as suas leitoras também devem estar. Vem cá, me diz uma coisa: Antes de
escrever, quem era você?
Gian
fica em silêncio. Ameaça dar uma resposta mas não consegue. Acaba se recolhendo
para dentro de si.
– Essa era a resposta que você
deveria saber – continuou Lara – Quem é você? “Notas Concernentes a Mim”. Que
tal isso, hein? E se você fosse o alvo de sua própria criação, portanto, saberia
como conduzi-la? Você visivelmente não sabe o que me dizer agora. Desculpe, não
fiz por mal. Todos nós temos dúvidas. É assim que aprendemos a superá-las.
Mantendo contato com elas através do próximo. “Notas Concernentes a... Ele?” “Bem,
ele não sabia o que dizer pois ouviu de si mesmo que não sabia quem era. Porque
dos outros é fácil falar, agora, falar de si? Quem dera! Nem adianta tentar...”.
– Você é boa nisso.
– Eu li o seu livro, Gian.
Gostei bastante, e me identifiquei muito.
– Nossa... você me pegou. Ficou feliz por testemunhar quão frágil sou?
– Não. Você não é frágil. Você
apenas não sabe o quão forte é. Você é esforçado. Que pena que não está sendo
suficiente.
– Você tem razão.
– Eu tenho? Olha, te disse um
monte de coisas. Você terá que apontar onde tenho razão, especificamente, se não me perco.
– De que essa é a resposta que
deveria saber. “Quem eu sou?” É difícil falar de si mesmo quando todo mundo
está te olhando e acredita em ti. É mais fácil quando ninguém espera nada de
você. Quando não há expectativas.
– Antes de escrever, seja apenas
você. Não faça o agrado dos outros. Essa já é uma responsabilidade maior do que
se pensa. Não basta só ser bom. É preciso saber por que e pra que você está
sendo tão bom.
CAPÍTULO
05
“Se
for escrever, Eternize seu sentimento”.
Gian havia tido uma
boa noite de sono. Ele dormiu não mais como se tivesse preso dentro de si, mas
sim como se estivesse livre para ser quem quisesse ser. E isso lhe deu
novas esperanças. Estava cheio de novas ideias e os seus pensamentos encobriam o
seu juízo, mas dessa vez não retiravam a sua lucidez. Pelo contrário, agora os seus
pensamentos faziam-lhe um favor: que era o de lhe deixar em paz. Não pensar por
algumas horas foi o melhor presente que Gian poderia receber. Ele ficou mais
alguns dias no Hotel onde estava hospedado e depois voltou para casa. Ele tinha
um compromisso muito importante nessa noite. E não podia perder essa
oportunidade novamente.
“Onde ela foi parar? Sempre que
estou sozinho, me pergunto. Ela está segura? Queria saber. Queria sua imagem
remover. E começar tudo de novo. Não sei onde procurá-la. Pois, a impressão que
ficou, foi a de que ela nunca se foi...”
GIAN PIETRO (NOTAS CONCERNENTES A ELA, VOL. 2).
Fizeram
uma pergunta a Gian que o fez viajar para o seu tempo de infância. Ele se
lembrou de uma história que sua mãe vivia lhe contando. Sobre a primeira vez em
que escreveu um texto. Ele tinha 4 anos e chegou para a sua mãe com um
papel que estava escrito: “Mãe todo mundo tem, mas eu tenho você”. Sua mãe
sempre lhe contava essa história com um entusiasmo e alegria por presenciar o
seu filho com tamanha engenhosidade.
As
palavras que Gian pensava naquele momento não chegavam nem próximo ao que ele
havia encontrado para dizer a sua mãe. Era como se as palavras a sua mãe
fossem a melhor tradução do amor que ele encontrou. “É para minha mãe que
escrevo?” – questionava-se Gian. Lembro-me de algo que minha mãe ensinou-me que
muito me marcou. Ela disse que “O silêncio de Deus era ele nos poupando do
sofrimento. E a sua fala, era ele nos salvando do silêncio” – pensou Gian. Na
época não havia entendido. Mas, hoje sei que o tempo fará com que as coisas se
organizem. E isso já é o suficiente para se alegrar.
– O que você diz, Gian?
Gian
olhou para aquele que lhe fazia uma pergunta. Esqueceu completamente de onde
estava. E aos poucos foi caindo em si e soube discernir onde estava.
– Desculpe-me, qual era a
pergunta mesmo? – perguntou Gian.
O
apresentador Carlos Junqueira o olhou, com um semblante confuso. Mas voltou a
fazer a mesma pergunta:
– Sabemos de tudo que você
conquistou. De seus textos e do alcance dos mesmos. Mas, em meio a tudo isso, todo
o sucesso e reconhecimento, a pergunta que te faço é: “Você é feliz?”
– Não sou feliz pelo que escrevo.
A felicidade veio antes – respondeu Gian.
– Como assim?
– A felicidade estará segura ao
meu redor, enquanto eu não exigir que a sua aparição venha e que se mantenha
sempre ao meu alcance. Caso eu faça isso, estarei tornando-a menor do que ela
é. Não quero ser reconhecido como aquele que falou aquilo em que todos queriam
ouvir e, ainda por cima, se acostumar com essa ideia. Quero ser lembrado como
alguém que fez o melhor que podia com o que tinha em mãos. Permitindo surpreender até a si mesmo.
– E o que você diria a essas
tantas mulheres que te amam?
– Não é a mim que elas amam. Elas
amam a imagem que idealizaram de mim. Uma idealização não cria amor. Pelo
contrário, ela o substitui, se movimentando em direção contrária. Isso é apenas
uma substituição da realidade por palavras. Não chega a ser suficiente. A
idealização ofusca o amor, que por sua vez é machucado pela realidade. Mas é
necessário manter contato com o real.
– Ok. Então nos responda algo. Para
quem são as “Notas Concernentes a Ela?” Quem é ela?
Ao
olhar para Carlos, e para o público que ali estava, a espera de sua resposta,
Gian respirou fundo e depois relaxou. Fechou os olhos e deu um leve sorriso. E
como se estivesse respondendo para si mesmo disse:
– Quem é ela? Ela sou eu. Somos nós.
São o que somos e decidimos nos tornar. E nós não somos sempre o que queríamos ser, não é? Mas sim a consequência do que fizemos para ser o que nos
tornamos. As notas são sobre as mulheres, obviamente. São elas quem uso como um
ponto de partida. Sobre todas elas. São sobre o que eu queria ouvir delas, em
momentos específicos que vivi. São sobre o que elas me disseram e pediram
para guardar segredo, enquanto ninguém estava olhando. São sobre o que entendi e
não entendi sobre o que elas me disseram. São sobre o que eu não sei se elas me
disseram, mas que por alguma razão atribuo a autoria para elas. São sobre o que
penso delas, mas que prefiro não dizer. E guardo para mim. Escrever é o melhor
que consigo fazer com o que tenho. E escrever faz com que aquilo que vivi continue
ativo dentro de mim.
– Está me dizendo que as notas
que escreve não possuem direção alguma? – perguntou Carlos.
– Me diga algo que não possua
nenhuma direção, que eu te apontarei onde está o erro.
– O que suas notas querem trazer de
novo nesse mercado literário, já saturado em que estamos vivendo?
– O problema é que o erro começa
quando admitimos um pressuposto que é totalmente desonesto. De que a presença
da originalidade sempre apontará indícios de que ali vive qualidade. E isso não
é verdade. Eu escrevo poesias. E como nos dizia o falecido poeta Ferreira
Gullar: “A poesia é a transformação da tristeza em alegria. A arte é a
alquimia. Transforma o sentimento em alegria”. E é isso que tento reproduzir
com o que escrevo. Quem dera que todos tivessem coragem de dizer o que sentem. A
coragem some quando notam que existe um alto preço a ser pago. Mas todos deviam
arriscar. Mesmo que seja um dizer sem palavras. Mesmo que seja uma
autoexpressão calada. Importa sim é que haja honestidade no ato.
– Entendo, entendo – complementou
Carlos.
– Eu posso ler um texto que hoje
cedo escrevi? Acho que resume bem o que estamos conversando agora.
– Claro. Fique a vontade.
Gian
pegou um papel dobrado que estava em seu bolso esquerdo. E o desenrolando,
começou a ler:
“Muitos perguntam quem é ela. Mas os mesmos que perguntam “Quem é ela?”, se esquecem de fazer a pergunta mais importante. Porque a pergunta mais importante não deveria ser “Quem é ela para mim?” Eu não sei “Quem é ela” para os outros. Eu sei “Quem é ela” para mim. E cada um deveria saber responder a isso. Nesse sentido, portanto, não há respostas erradas. O que há são respostas que vem do coração. Pois “Quem seria ela”, senão a minha razão de continuar escrevendo e/ou fazendo o que faço? “Quem seria ela”, senão a minha razão para continuar dizendo o que digo? “Quem seria ela”, senão a minha razão para permanecer junto dela? Vocês me perguntam “Quem é ela?”, mas deveriam está criando e/ou procurando suas respostas ao invés de exigir de mim uma resposta que não caberiam dentro de vocês. Pois toda resposta tem tamanhos e formas diferentes. Quando eu digo que não sei “Quem é ela”, estou me referindo a não saber quem é ela para você. Pois pra mim eu sei muito bem Quem ela é”.
Carlos
demonstrou um semblante de contentamento. Olhou para Gian, balançou a cabeça em
sinal de concordância, e em seguida disse:
– Muito bom, Gian. Então, vamos
para o intervalo e já voltamos.
Depois
da entrevista, Gian voltou para casa e terminou o seu 2º volume do Livro “Notas
Concernentes a Ela”. Agora ele queria construir um Romance. Construir então um arco
onde pudesse falar sobre aquilo que sentia sem levar em consideração o peso das
pressões externas que faziam a ele.
Entrou
em contato com a Lara para poder lhe contar as novidades.
– Não, é claro que eu quis dizer
o mesmo que você entendeu – disse Gian a Lara, deixando-a perplexa.
– Você vai desistir de sua
carreira? – perguntou Lara.
– Não é desistir. É seguir a
direção que o meu coração aponta.
– Que o seu coração aponta? Sério
que acredita nisso?
– Ora, você não tem uma voz
interna que te ajuda a tomar decisões, não?
– Sim, eu tenho uma voz interna.
E, baseada em minhas últimas experiências, tenho tentado ao máximo não dar
ouvidos a ela.
– Logo você, Lara. Logo você, que
tanto me ensinou, não consegue ensinar a si mesma?
Lara
deu um sorriso a Gian. Deu-lhe um abraço e ficou com a sua cabeça encostada no
peito de Gian por alguns minutos.
– Não vamos terminar juntos, não
é? – perguntou Gian a Lara, com um tom convidativo na fala, como forma de quebra
do silêncio que ambos estavam.
– Não, não nessa história – respondeu Lara – Ela já está chegando ao fim,
não percebe? Não dá tempo de criar uma nova trama em que fiquemos juntos. Não
nesse capítulo de nossas vidas.
– Nossa, você realmente acredita
que estamos dentro de uma história criada por um escritor, não é? Tipo como se fôssemos
o fruto da imaginação inventiva de alguém.
– Claro que acredito nisso. Às
vezes cometo cada burrada que não pode ser eu. Deve ser alguém que está me
controlando e criando ações e diálogos pra mim, só pode.
– Mas você sabe que isso
significaria que não somos autores de nossa linha temporal de vida. Isso faz da
gente marionetes que aprenderam a reproduzir e fazer aquilo que alguém disse
que precisaríamos fazer. Alguém estaria dizendo isso para nós.
– E isso não se chama viver a vida?
– Você acha?
– Não tenho problema com isso. Eu
sou uma mulher complicada, não percebeu? Não me encaixaria em seu mundo de
qualquer jeito. E nem creio que você caberia no meu.
– Entendi. Está se fazendo de
desinteressada de propósito.
– É claro que estou.
Provavelmente você iria ser o amor da minha vida. Mas eu vou deixar passar essa
oportunidade, pois acho que ainda tenho muitos erros para cometer antes de me
acertar com alguém. Mas só me promete uma coisa? Que não chorará por mim depois
que for embora?
– Eu já estou chorando.
– Está bom. Eu só não me
responsabilizo pelos sentimentos alheios, tá?
– Você só melhora, hein? Nossa,
como você é...
– Maravilhosa?
– Na verdade, eu iria dizer o
oposto disso. Mas, tudo bem. Você é maravilhosa em seus devaneios. E isso faz
de ti incomparável.
– Você vai escrever sobre mim?
– Ao seu tempo. Você é real. Não
preciso te criar ou fingir que não existe, e construir um sentimento. Só basta
te olhar para saber que texto algum iria te capturar. Obrigado.
– O que foi?
– Esse talvez tenha sido o meu melhor texto.
– Por que diz isso?
– Porque foi o único que posso
dizer que vivi.
– E por último, nunca se esqueça, Gian.
Se for escrever, eternize seu sentimento. Porque essa será a melhor forma de
mantê-lo vivo. Não espere pelo reconhecimento, espere pelo amor no desenvolvimento.
FIM
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